ANÁLISE TÉCNICA DOS ESTUDOS AMBIENTAIS

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Os estudos de impacto ambiental são feitos normalmente dentro de um contexto legal que estabelece requisitos a serem observados e procedimentos a serem cumpridos. Dentro do processo de AIA, a etapa de avaliação ou análise técnica dos estudos ambientais apresentados1 tem a função de verificar a conformidade dos estudos apresentados com critérios preestabelecidos. Para aplicações a decisões de licenciamento ambiental, os critérios usualmente observados são a regulamentação em vigor na jurisdição em que foi apresentado o estudo e os termos de referência previamente formulados. Quando se trata de decisões de financiamento, o objetivo da análise é verificar a conformidade com os procedimentos e requisitos adotados pela instituição financeira (por exemplo, os Princípios do Equador). Finalmente, no âmbito interno às empresas, uma análise de terceira parte de um estudo ambiental poderá verificar sua conformidade com regras corporativas ou outros requisitos adotados voluntariamente pela empresa. Ainda no âmbito interno, uma análise de terceira parte poderá analisar um estudo ambiental antes de sua apresentação ao órgão governamental ou ao agente financeiro.

Um balanço adequado entre descrição e análise, rigor metodológico e isenção são as três principais qualidades de todo estudo ambiental. Um estudo exaustivamente descritivo, sem interpretação dos dados e com parca aplicação destes para a análise dos impactos, tem tão pouca utilidade quanto uma coleção de opiniões que não esteja solidamente ancorada em dados rigorosamente coletados ou compilados. Da mesma forma, um texto que “defenda” o projeto, apenas apontando suas vantagens e minimizando seus inconvenientes, é inútil como fundamento para qualquer tomada de decisões, embora possa — infelizmente — ser utilizado como justificativa.

Uma definição muito simples do que seria um bom EIA é dada por Lee (2000a, p. 138): “é aquele que apresenta, de uma forma apropriada para os usuários, constatações e conclusões que cubram todas as tarefas da avaliação, empregando métodos apropriados de coleta de informação, análise e comunicação”. Em outras palavras, um bom EIA é aquele que tem as qualidades de todos os bons relatórios técnicos. Portanto, forma e conteúdo deverão ser analisados.

15.1 FUNDAMENTOS

Em cada sistema de AIA, a regulamentação estabelece a quem cabe a responsabili-dade de analisar os estudos. Na legislação brasileira cabe aos órgãos ambientais licenciadores a análise dos estudos ambientais. Já no contexto de uso da AIA para fundamentar decisões de financiamento, tal análise cabe à equipe interna socioambiental dessas instituições, com frequente emprego de consultores externos. Há ainda outros modelos, adotados em diferentes jurisdições, como o interagency review, previsto na legislação americana, ou as comissões independentes de avaliação, empregadas no Canadá e na Holanda.

No Canadá, essas comissões de avaliação estão regulamentadas, no plano federal, pelas Leis Canadenses de Avaliação Ambiental, tanto a lei de 1992 quanto a de 2012, mas o modelo já era adotado desde que foi lá implantada a avaliação de impacto ambiental, em 1973 (Ross, 1987). Para cada projeto que requeira um estudo aprofundado, uma comissão (panel) é nomeada e uma de suas tarefas é analisar a conformidade do EIA. Na Holanda, os membros da Comissão de Avaliação de Impacto Ambiental têm um mandato predeteminado e são inamovíveis; emitem uma opinião sobre todos os EIAs preparados no âmbito de sua competência (conforme seção 17.1).

Independentemente das modalidades e competências determinadas pelos regulamentos aplicáveis, os objetivos da análise técnica dos estudos de impacto ambiental podem ser enunciados como os de avaliar se o estudo apresentado:

  atende a requisitos mínimos estabelecidos pela regulamentação aplicável;

  tem qualidade técnica suficiente para subsidiar a tomada de decisões sobre o empreendimento.

Em outras palavras, busca-se determinar se o estudo de impacto tem forma e conteúdo satisfatórios e adequados.

O nível de análise mais elementar é aquele que se preocupa com a forma dos estudos, ou seja, o denominador comum estabelecido pela regulamentação. No Brasil, o conteúdo mínimo dos estudos de impacto ambiental é determinado pela Resolução Conama 1/86, mas os órgãos licenciadores podem ter seus próprios critérios (desde que estes não contradigam ou sejam menos restritivos que aqueles estabelecidos na norma federal). Evidentemente, um estudo que não atenda ao conteúdo mínimo não pode ser aceito. Mais do que isso, as decisões eventualmente tomadas com base em tal estudo (por exemplo, a concessão de uma licença ambiental) podem ser questionadas juridicamente e consideradas nulas.

A apreciação do conteúdo dos estudos ambientais deve ser feita com base em certos critérios preestabelecidos, por meio dos quais se avalia a qualidade e a adequação dos estudos apresentados. O julgamento sobre a qualidade dos estudos normalmente é feito com base em uma comparação com aquilo que seria esperado. De um modo geral, há duas grandes linhas de critérios de comparação: (i) os termos de referência estabelecidos para o estudo de impacto ambiental analisado e (ii) as boas práticas adotadas internacionalmente.

O critério de comparação com os termos de referência tem a vantagem de prover um quadro sistemático para análise dos estudos apresentados: basicamente, o analista vai comparar o que pedem os termos de referência com aquilo que foi apresentado nos estudos. A desvantagem da abordagem é não dar espaço para uma avaliação crítica dos próprios termos de referência. Em outras palavras, se os termos de referência forem ruins ou insuficientes para determinar o âmbito e o escopo dos estudos ambientais, então sua análise também ficará prejudicada, pois serão contemplados os aspectos formais, mas não os substantivos. Pode ser, inclusive, que os estudos ambientais sejam melhores que os termos de referência.

O critério de comparação com as boas práticas utiliza como referência (benchmark) o que há de melhor e mais consistente na atualidade em termos de estudos ambientais, no plano internacional, para o tipo de empreendimento em análise. A vantagem desse critério é dar maior ênfase ao conteúdo, aos aspectos substantivos dos estudos apresentados. O mesmo também pode ser utilizado quando o estudo de impacto ambiental foi feito sem discussão prévia de termos de referência específicos (prática comum em muitos estados brasileiros). Por outro lado, uma possível desvantagem é estabelecer um patamar alto demais para o país em que se localiza o projeto analisado — estudos de melhor qualidade normalmente exigem mais em termos de custo e de tempo de realização, e estudos realizados em países desenvolvidos podem beneficiar-se de uma base preexistente de dados ambientais que muitas vezes está ausente nos países em desenvolvimento.

As melhores práticas internacionais de avaliação de impacto ambiental vêm sendo seguidamente invocadas e citadas neste livro. Consistem em recomendações emanadas de entidades de reconhecida credibilidade — como associações profissionais e organizações internacionais —, e endossadas por convenções internacionais — como as Conferências das Partes da Convenção da Diversidade Biológica e da Convenção de Ramsar (documentos citados no Apêndice “Recursos”).

É oportuno ressaltar que o critério de comparação com termos de referência e o critério de melhores práticas não são excludentes. Se houve preparação prévia de termos de referência, então a análise dos estudos deve obrigatoriamente tê-los como base, mas não precisa limitar-se a eles. Para um país como o Brasil, o critério das melhores práticas é não somente passível de aplicação, como também desejável, uma vez que já existe grande experiência acumulada em avaliação de impacto ambiental e que os serviços de consultoria nesse campo são, via de regra, bem competentes tecnicamente. Além disso, e o mais importante, em grande parte do País existe tal acúmulo de pressões sobre o ambiente natural e social, que qualquer nova obra de envergadura (que possa acarretar impactos significativos) deve ser analisada e discutida cuidadosa e detalhadamente.

A análise técnica de um estudo de impacto ambiental não é de interesse exclusivo do agente decisório. Todos os protagonistas podem analisar os estudos e tentar influenciar o processo decisório, como:

  Empresas que contratam estudos de impacto ambiental podem analisá-los antes de submetê-los à aprovação dos órgãos governamentais ou de agentes financeiros.

  Associações que representam o público, como organizações não governamentais e associações de moradores, podem analisar os estudos para buscar um melhor entendimento do projeto e de suas consequências. No caso de posturas contrárias ao projeto, a análise pode apontar falhas e lacunas que podem ser apresentadas como argumentos no debate; ela pode também indicar deficiências do projeto ou apontar para alternativas não estudadas, ou ainda sugerir novas medidas mitigadoras ou compensatórias, não consideradas no estudo.

  Membros do Ministério Público, assistentes técnicos e peritos judiciais, no caso de disputas judiciais envolvendo atividades sujeitas ao processo de avaliação de impacto ambiental.

  Agências setoriais reguladoras e outros órgãos governamentais interessados no empreendimento apresentado.

  Agentes financiadores públicos ou privados, cuja política inclua a discussão da viabilidade ambiental dos empreendimentos que lhes são submetidos.

  Órgãos governamentais com atribuições específicas, que devem ser ouvidos no licenciamento de uma atividade.

Em todos os casos, a análise pode ser feita internamente ou por uma terceira parte contratada para esse fim. Em geral, espera-se que os órgãos ambientais responsáveis pelo licenciamento disponham de equipes multidisciplinares capacitadas para realizar a análise técnica. No entanto, mesmo os organismos mais bem aparelhados em pessoal técnico podem deparar-se com projetos muito complexos ou com situações que fujam à experiência de sua equipe técnica, ocasiões em que devem lançar mão de consultores especializados para complementar a capacitação interna.

15.2 O PROBLEMA DA QUALIDADE DOS ESTUDOS AMBIENTAIS

Estudos retrospectivos que visam a uma avaliação crítica de estudos ambientais e, principalmente, apontar suas deficiências, foram publicados por pesquisadores de vários países. Uma linha de pesquisa aborda a capacidade preditiva dos EIAs (conforme seção 10.4), mas tais estudos somente podem ser realizados para projetos que seguiram adiante e foram implantados, após a aprovação dos estudos. O trabalho clássico de Beanlands e Duinker (1983) não só apontou deficiências recorrentes em EIAs canadenses, como formulou diversas recomendações que hoje integram o conjunto de boas práticas de AIA.

Um resumo de pesquisas feitas em diversos países sobre a qualidade dos estudos de impacto ambiental é apresentado no Quadro 15.1. O tema é recorrente na literatura e continua a preocupar. Nos estudos listados, as amostras foram escolhidas de maneira diferente, e os métodos de análise também variaram. Parte das pesquisas aplicou critérios homogêneos de análise a uma determinada amostra de EIAs, atribuindo notas a seções de cada EIA. Os procedimentos de análise desenvolvidos por Lee e Colley, sob encomenda da Comissão Europeia, e o próprio Guia da Comissão foram a base para vários estudos europeus. Esses procedimentos serão apresentados na seção 15.3. Alguns estudos verificaram a evolução ou melhoria ao longo do tempo, com resultados positivos nos casos alemão, britânico, português e brasileiro. No estudo grego, os autores encontraram que os EIAs de melhor qualidade eram os de projetos de maior porte. Nos casos sul-africanos, o exame dos EIAs mostrou que os capítulos de caráter descritivo obtiveram notas superiores aos capítulos mais analíticos, ao passo que o estudo do setor florestal britânico observou uma maioria de EIAs “muito ruins” ou “ruins”, devido a scoping insatisfatório, inadequadas identificação e avaliação da importância dos impactos. No estudo finlandês, um aspecto interessante é que as notas atribuídas pelos analistas do setor público foram mais baixas que as notas atribuídas por consultores que preparam EIAs (que, no estudo, analisaram EIAs feitos por terceiros).

A qualidade dos EIAs realizados no Brasil foi analisada em um certo número de estudos retrospectivos. Agra Filho (1993) analisou vinte EIAs e Rimas preparados para projetos de diversos setores de atividade, em diferentes regiões do Brasil, durante os cinco primeiros anos de vigência da Resolução Conama 1/86. Uma de suas principais constatações diz respeito à pobre definição do escopo dos estudos que, nos casos analisados, não levou em conta aspectos fundamentais de referência para sua realização, ou seja, o autor concluiu que a ausência ou a debilidade de termos de referência é fator que compromete todo o processo de AIA, a começar pela qualidade dos estudos apresentados. O autor também constatou que (i) a consideração de alternativas foi negligenciada; (ii) as medidas mitigadoras propostas muitas vezes eram genéricas e não correspondiam às características do ambiente afetado; (iii) os planos de monitoramento eram superficiais e não apontavam indicadores; (iv) há uma carência de procedimentos técnicos adequados para identificar e prever impactos; e (v) os procedimentos de valoração e interpretação do significado e importância dos impactos não permitem uma avaliação conclusiva.

Quadro 15.1 Síntese de estudos sobre a qualidade de EIAs

Teixeira et al. (1994) revisitaram sete dos dez primeiros Rimas preparados para empreendimentos hidrelétricos no Brasil, entre 1986 e 19882. À época, as grandes barragens eram fortemente questionadas devido à extensão e gravidade de seus impactos ecológicos e sociais e a um histórico de danos irreversíveis, como a inundação das Sete Quedas do rio Paraná (Fig. 5.1), além do deslocamento forçado de milhares de pessoas sem compensações adequadas. Por tais razões, a empresa estatal Eletrobrás havia preparado um Manual de Estudos de Efeitos Ambientais de Sistemas Elétricos, tornado público (Eletrobrás, 1986), cujo conteúdo coincide em parte com as exigências da Resolução Conama 1/86. O manual aborda três tipos de empreendimentos — usinas hidrelétricas, usinas termelétricas, linhas de transmissão e subestações —, descrevendo, para cada tipo, requisitos para estudos de planejamento; no caso das hidrelétricas, há um “plano de levantamentos básicos” e um “plano de controle ambiental”.

Nesse contexto, os estudos ambientais de projetos do setor elétrico provavelmente representavam, à época, o que havia de mais avançado no Brasil. Ainda assim, Teixeira e colaboradores encontraram inúmeras deficiências importantes nos Rimas, podendo-se destacar:

  omissões e previsões subestimadas de impactos;

  critérios de valoração de impactos “subjetivos e técnicos, em detrimento da percepção que as populações têm desses impactos sobre elas e as conseqüências sobre seu próprio universo” (p. 175);

  falta de menção a estudos de alternativas locacionais e tecnológicas;

  as populações humanas são tratadas como “facilmente deslocáveis e convenientemente adaptáveis a novas condições”, merecendo “tratamento igual ao aplicado nos aspectos biológicos ou físicos dos espaços ocupados pelas hidrelétricas” (p. 176-177);

  desconsideração dos processos sociais em diagnósticos fortemente descritivos que enfatizam aspectos demográficos;

  imprecisão de critérios para definir a população atingida e a área afetada ou área de influência.

É interessante observar que essa análise, se comparada à análise de Monosowski (1994) sobre os estudos ambientais realizados para a hidrelétrica Tucuruí (Cap. 2), permite inferir que teria havido pouco ou nenhum avanço em relação à época que precedeu a exigência de preparação prévia de EIAs. A usina de Tucuruí, cuja construção teve início em 1976, começou a funcionar em 1984. O diagnóstico ambiental foi fragmentário, elaborado durante a fase de construção, e composto por diversos estudos especializados preparados por instituições de pesquisa da Amazônia, que fizeram levantamentos bastante completos, chegando a identificar novas espécies. Porém, afirma a autora:

Observa-se um grande contraste entre o grande número de estudos realizados e a dificuldade de traduzir suas conclusões em propostas concretas de ação. De um modo geral, os estudos foram concebidos como atividades regulares de pesquisa científica. Os esforços da equipe se concentraram sobretudo nas atividades de inventário e descrição dos elementos do meio natural, o que se justificava pelo profundo desconhecimento inicial dos ecossistemas da região (p. 130).

Assim, a fraca conexão entre as diferentes partes do estudo de impacto ambiental persistia como um problema.

As deficiências não eram somente dos estudos ambientais, mas, antes deles, dos projetos de engenharia, concebidos antes que exigências ambientais tivessem se tornado explícitas. Assim, as barragens propostas para o rio Xingu eram criticadas devido aos impactos muito significativos que teriam sobre o ambiente natural e sobre as comunidades indígenas (Hildyard, 1989; Santos e Andrade, 1988). Sem dúvida, há qualidades e deficiências intrínsecas a cada estudo de impacto ambiental, e que estão sob controle da equipe multidisciplinar que o prepara, mas se o projeto analisado for de alto impacto ou afetar recursos muito valorizados, por melhor que seja o EIA, o projeto será severamente criticado. Duas décadas depois, esse problema ainda perdura. Na análise de um EIA, embora se deva diferenciar entre as deficiências do estudo e os problemas do projeto, muitas vezes não há como se fazer uma separação completa.

Na opinião de Moreira (1993a), a prática dos primeiros anos de AIA no Brasil padecia de uma série de dificuldades. Entre os problemas atinentes à preparação dos EIAs, a autora comenta que

[…] o que mais afeta os estudos são os problemas de coordenação técnica. As empresas de consultoria tendem a tratar a organização dos estudos de impacto como tratam os trabalhos com que estão mais familiarizadas. O coordenador limita-se a distribuir e cobrar as tarefas, controlar os gastos e os cronogramas e fornecer apoio aos profissionais das diferentes disciplinas, deixando a desejar a integração dos aspectos setoriais do meio ambiente, quase sempre interdependentes. O produto são relatórios formados de estudos setoriais justapostos que não conseguem representar as possíveis alterações a serem produzidas nos sistemas ambientais pela realização do projeto. As equipes encarregadas de um estudo de impacto ambiental precisam de coordenação e métodos apropriados […] (p. 43).

A percepção de que muitos consultores eram mal qualificados, que não entendiam os objetivos e muito menos os fundamentos da AIA, e que reduziam sua atividade a preparar documentos que pudessem facilitar a obtenção de uma licença ambiental levou ao surgimento da expressão “indústria do Rima”, indicando a preparação em série de relatórios quase idênticos, embora para projetos distintos.

Um teste simples consiste em verificar a coerência da avaliação da importância dos impactos identificados. Em muitos EIAs, os impactos benéficos são sistematicamente avaliados como de grande importância, ao passo que os adversos são sempre apresentados como de menor importância. Assim, compilar uma lista dos impactos, segundo sejam positivos ou negativos, e em seguida verificar que grau de importância foi atribuído a cada um pode revelar um EIA tendencioso. Embora seja teoricamente possível encontrar um projeto para o qual predominem os impactos positivos, os EIAs são majoritariamente feitos para aquelas propostas que possam causar significativa degradação ambiental, de onde se pode esperar que, na maioria dos casos, os impactos adversos sejam mais frequentes. Para iniciativas cujas consequências prováveis sejam majoritariamente positivas, a fase de triagem deve ter levado à dispensa de um estudo ambiental.

Parte dos problemas pode ser atribuída a deficiências da etapa de triagem, que levaram à preparação de uma grande quantidade de EIAs para empreendimentos de impacto pouco significativo ou, pior, para empreendimentos já em operação havia anos, embora em situação irregular perante a legislação de licenciamento ambiental. Esse problema foi claramente diagnosticado no Estado de São Paulo para o setor de produção de areia de construção civil, que nos primeiros anos de aplicação da AIA respondia por mais da metade dos EIAs protocolizados na Secretaria do Meio Ambiente, em claro descompasso com sua importância na economia estadual ou seu potencial de causar impactos adversos. Esses empreendimentos são muito semelhantes entre si, seus impactos se repetem e podem ser prevenidos e corrigidos com medidas semelhantes, o que faz que a maior parte de seus problemas ambientais possa ser resolvida com procedimentos mais simples, mediante a aplicação de normas técnicas (conforme a discussão sobre triagem, seção 5.2).

Libanori e Rodrigues (1993, p. 127) informam que, no período de menos de três anos até setembro de 1991, de um total de 145 EIAs analisados pelo Departamento de Avaliação de Impacto Ambiental da Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, 96 eram de pequenos empreendimentos minerários, a maior parte dos quais de extração de areia para uso na construção civil. A extração de areia para fins de construção civil faz parte do rol de atividades do Art. 2º da Resolução Conama 1/86. Há um debate acerca da aplicação dessa lista, havendo os que defendem que ela exemplifica os tipos de empreendimentos cuja implantação está sujeita à apresentação prévia do EIA, no sentido de que todos os que constam da lista são obrigatórios, podendo o órgão licenciador exigir o EIA de outras atividades não constantes da lista (Machado, 1993). Outros defendem que o caráter exemplificativo da lista faculta ao órgão licenciador eximir da apresentação do EIA alguns tipos de empreendimentos que constam da lista, mas de impacto pouco significativo (Gouvêa, 1993). Esta última interpretação acabou prevalecendo no Estado de São Paulo (Gouvêa, 1998) e foi resolvida pelo próprio Conama, primeiramente para atividades de mineração (Resoluções 9 e 10/90) e depois para outros tipos de atividade (Resolução 237/97 e várias outras que se seguiram, conforme Quadro 3.5).

Um certo desapontamento com os primeiros resultados das leis que tornaram obrigatória a avaliação de impacto ambiental parece quase universal. Há, porém, de se discernir as críticas aos procedimentos, que não estariam atingindo os resultados esperados e deveriam ser aprimorados, das críticas aos próprios princípios e fundamentos da AIA, que tampouco faltaram4. Como exemplo desse tipo de crítica, pode-se citar as ponderações de Fairfax (1978), para quem a Nepa foi “um desastre para o movimento ambientalista e para a busca de uma melhor qualidade ambiental”, por desviar a atenção do “questionamento e redefinição de poderes e responsabilidades das agências governamentais para a análise de documentos”.

Embora boa parte dos observadores saliente os avanços obtidos com a lei americana (Greenberg, 2012), nos primeiros anos de sua aplicação diversos analistas sugeriram que os resultados alcançados estariam muito aquém do esperado, e dentre as razões apontadas tinha grande destaque o entendimento de que a maioria dos estudos de impacto ambiental seria de qualidade sofrível, o que não permitiria que decisões adequadas fossem tomadas tendo esses estudos como base. Os críticos sugeriam que os estudos deveriam ser mais científicos, o que poderia ser alcançado por intermédio de uma revisão pelos pares, fazendo-os passar por um processo semelhante ao de uma publicação científica (Schlinder, 1976) ou submetendo à publicação as pesquisas que serviriam de base a esses estudos (Loftin, 1976). No entanto, outras opiniões fortaleciam o papel da análise feita pelos analistas dos órgãos governamentais — e não a crítica da parte de cientistas — e o papel do público, também interessado na qualidade dos estudos apresentados e em seu conteúdo (Auerbach et al., 1976).

Os primeiros anos de aplicação da AIA no Canadá também resultaram em “um alto nível de frustração” dos principais envolvidos (Beanlands, 1993b). Na França, as críticas centraram-se mais nos procedimentos administrativos e no que era percebido por muitos como insuficiente independência dos serviços administrativos que analisam os estudos de impacto, enquanto o conteúdo propriamente dito dos estudos não foi objeto de discussões aprofundadas.

Uma vertente que foi objeto de investigações empíricas sistemáticas em diversas pesquisas internacionais é a qualidade das previsões apresentadas nos EIAs. No início dos anos 1980, um dos focos das pesquisas sobre a eficácia da AIA voltava-se para a qualidade e o acerto das previsões feitas nos estudos de impacto ambiental (conforme seção 10.4). Dentre os trabalhos pioneiros, costumam ser referidos Bisset (1984b), Buckley (1991a, 1991b), Culhane (1985) e Culhane et al. (1987). Esses autores, analisando, respectivamente, casos da Grã-Bretanha, da Austrália e dos Estados Unidos, até mesmo uma amostra de cerca de uma centena de estudos de impacto ambiental no caso australiano, tiraram basicamente duas conclusões. A primeira é que muitas das previsões apresentadas nesses estudos não eram passíveis de verificação, seja por não serem quantitativas, seja por diversas outras deficiências relacionadas à forma como eram apresentadas, como falta de indicação da abrangência espacial dos impactos (área de influência) ou falta de escolha de indicadores apropriados para monitorar os impactos reais. Estudos conduzidos no Brasil sob essa óptica chegaram a conclusões similares (Dias e Sánchez, 2001; Prado Filho e Souza, 2004).

Esses estudos, que eram chamados de auditoria da avaliação de impacto ambiental, tiveram uma segunda conclusão consistente: a de que muitos projetos realmente implantados eram bastante diferentes daqueles que haviam sido descritos nos estudos de impacto ambiental, uma situação que, evidentemente, dificulta ou mesmo impede qualquer comparação entre impactos previstos e impactos reais. As razões dessas alterações têm a ver com o tempo transcorrido desde o planejamento do projeto e a preparação do estudo de impacto até sua aprovação e início da construção. As modificações também estão ligadas ao baixo grau de detalhamento dos projetos quando são preparados os estudos de impacto ambiental; entre um projeto básico de engenharia — o estágio em que são muitas vezes feitos os estudos ambientais – e um projeto executivo, muitas modificações costumam ser introduzidas. Aliás, se uma das funções do EIA é fazer que as ações humanas tenham o menor impacto possível, então é de se esperar que haja modificações entre a concepção inicial do projeto e uma versão modificada, na qual os fatores ambientais tenham sido incorporados (conforme o exemplo da rodovia dos Imigrantes, apresentado na seção 13.2 e no Quadro 13.3).

Os órgãos ambientais brasileiros, como, aliás, a maioria de seus congêneres em outros países, não fazem uma análise ou uma classificação sistemática da qualidade dos estudos apresentados, de forma tal que seja possível alguma comparação ou aferição de sua qualidade. (Exceção, talvez única, é a Agência de Proteção Ambiental americana, conforme será visto na seção 15.3.). É lícito pensar que a qualidade dos EIAs melhore ao longo do tempo, conforme tanto as equipes que os preparam como aquelas que os analisam ganhem mais experiência e possam, espera-se, aprender a partir de seus erros e acertos. Lee (2000a) reporta que dois levantamentos encomendados pela Comissão Europeia, respectivamente no início e no final da década de 1990, para analisar a qualidade de EIAs produzidos em oito países, concluíram que houve uma melhora na qualidade dos estudos. Ambos os levantamentos, evidentemente, empregaram os mesmos critérios para avaliar suas amostras de EIAs. Na Holanda, a Comissão de Avaliação de Impacto Ambiental publica relatórios anuais de atividades, apresentando balanços e análises; cerca de 40% dos EIAs analisados apresentam algum tipo de deficiência que implica a requisição de informações complementares (Ceia, 2002b); entre as deficiências mais comuns encontram-se a falta de apresentação detalhada de alternativas e uma descrição incompleta dos impactos.

No Brasil ainda há poucos estudos sistemáticos sobre amostras de EIAs (em contraposição a críticas a EIAs individuais). Todavia, uma compilação ao mesmo tempo abrangente e detalhada das principais deficiências dos EIAs foi feita por uma equipe de analistas do Ministério Público Federal (MPF). Estudando uma amostra de oitenta EIAs de projetos submetidos a licenciamento federal ou que implicaram, por razões diversas, o envolvimento do MPF, os autores desse estudo identificaram as falhas mais frequentes ou mais graves (MPF, 2004), resumidas no Quadro 15.2.

É extensa a lista dos problemas encontrados pelos analistas do MPF nos diagnósticos ambientais, problemas que envolvem desde questões de ordem metodológica até levantamentos incompletos. O diagnóstico ambiental é a parte mais facilmente criticável dos EIAs, haja vista que os inventários sempre podem ser mais detalhados e as análises mais aprofundadas. Há, portanto, de se estabelecer qual a extensão e o grau de detalhe dos estudos necessários para fundamentar a análise dos impactos e a proposição de medidas de gestão, de modo que a análise técnica do EIA tenha como referência esses requisitos mínimos. Logo, é na etapa de preparação dos termos de referência que devem ser buscadas as causas das falhas mais comuns dos diagnósticos ambientais, pois é antes de ter início a preparação propriamente dita do EIA que devem ser definidos os levantamentos necessários, a extensão da área de estudo, os métodos empregados e vários outros parâmetros para orientar o estudo a ser feito. Com termos de referência falhos, grande é a probabilidade de se encontrar estudos ambientais falhos. Naturalmente, um EIA feito a partir de excelentes termos de referência também pode ser de má qualidade, concorrendo para isso outros fatores, como capacitação da equipe e os recursos disponíveis.

Também é preocupante a observação do trabalho do MPF de que há desconexão entre o diagnóstico ambiental, a análise de impactos e as propostas de mitigação, deficiência já apontada no caso de Tucuruí e ainda persistente e alguns EIAs. Um bom EIA não se faz somente com um bom diagnóstico, mas com um adequado balanço entre diagnóstico, prognóstico e propostas factíveis e eficazes de atenuação dos impactos adversos e valorização dos impactos benéficos.

Quadro 15.2 Deficiências em estudos de impacto ambiental no Brasil

ELEMENTO DO EIA

PRINCIPAIS DEFICIÊNCIAS

Estudo de alternativas

Ausência de proposição de alternativas

Apresentação de alternativas reconhecidamente inferiores à selecionada no EIA

Prevalência dos aspectos econômicos sobre os ambientais na escolha de alternativas

Comparação de alternativas a partir de base de conhecimento diferenciada

Delimitação das áreas de influência1

Desconsideração da bacia hidrográfica

Delimitação das áreas de influência sem alicerce nas características e vulnerabilidades dos ambientes naturais e nas realidades sociais regionais

Diagnóstico ambiental

Prazos insuficientes para a realização de pesquisas de campo

Caracterização da área baseada, predominantemente, em dados secundários

Ausência ou insuficiência de informações sobre a metodologia utilizada

Proposição de execução de atividades de diagnóstico em etapas do

licenciamento posteriores à Licença Prévia

Falta de integração dos dados de estudos específicos

Diagnóstico ambiental — meios físico e biótico

Ausência de mapas temáticos

Utilização de mapas em escala inadequada, desatualizados e/ou com ausênciade informações

Ausência de dados que abarquem um ano hidrológico, no mínimo

Apresentação de informações inexatas, imprecisas ou contraditórias

Deficiências na amostragem para o diagnóstico

Caracterização incompleta de águas, sedimentos, solos, resíduos, ar etc.

Desconsideração da interdependência entre precipitação e escoamento

superficial e subterrâneo

Superficialidade ou ausência de análise de eventos singulares em projetos envolvendo recursos hídricos

Ausência ou insuficiência de dados quantitativos sobre a vegetação

Ausência de dados sobre organismos de determinados grupos ou categorias

Ausência de diagnóstico de sítios de reprodução (criadouros) e alimentação de animais

Diagnóstico ambiental — meio antrópico

Pesquisas insuficientes e metodologicamente ineficazes

Conhecimento insatisfatório dos modos de vida de coletividades socioculturaissingulares e suas redes intercomunitárias

Ausência de estudos orientados pela ampla acepção do conceito de patrimôniocultural

Não adoção de uma abordagem urbanística integrada em diagnósticos de árease populações urbanas afetadas

Caracterizações socioeconômicas regionais genéricas, não articuladas às pesquisas diretas locais

Identificação, caracterização e análise dos impactos

Não identificação de determinados impactos (omissões em termos de impactos passíveis de previsão, impactos negativos indiretos sequer mencionados)

Identificação parcial de impactos

Identificação de impactos genéricos (por vezes são tantos os impactos agrupados sob um único título que sua importância e significado não podem ser estabelecidos satisfatoriamente

Identificação de impactos mutuamente excludentes

Subutilização ou desconsideração de dados dos diagnósticos

Omissão de dados e/ou de justificativas quanto à metodologia utilizada para atribuir pesos aos atributos dos impactos

Cumulatividade e sinergismo de impactos

Aspectos desconsiderados

Mitigação e compensação de impactos

Proposição de medidas que não são a solução para a mitigação do impacto

Indicação de medidas mitigadoras pouco detalhadas

Indicação de obrigações ou impedimentos, técnicos e legais, como propostas de medidas mitigadoras

Ausência de avaliação da eficiência das medidas mitigadoras propostas

Deslocamento compulsório de populações: propostas iniciais de compensaçõesde perdas baseadas em diagnósticos inadequados

Não incorporação de propostas dos grupos sociais afetados, na fase de formulação do EIA

Proposição de Unidade de Conservação da categoria de uso sustentável para a aplicação dos recursos, em casos não previstos pela legislação

Programa de monitoramento e acompanhamento ambiental to

Erros conceituais na indicação de monitoramento

Ausência de proposição de programa de monitoramento de impactos específicos

Rima

O Rima é um documento incompleto

Emprego de linguagem inadequada à compreensão do público

1 A rigor, áreas de estudo.

Fonte: MPF (2004).

Por outro lado — mas em outro registro, o do debate ético, e não sobre a qualidade do trabalho técnico —, há os casos de acusações de fraudes, quando um estudo ambiental deliberadamente ocultaria informação relevante e que, se “colocada sobre a mesa”, poderia levar a uma decisão desfavorável ao projeto. Um dos casos de maior repercussão foi o EIA da usina hidrelétrica Barra Grande, já em operação no rio Pelotas, divisa entre Rio Grande do Sul e Santa Catarina. O estudo “não viu a floresta” (Prochnow, 2005), ou seja, não mencionou a existência de um fragmento de vegetação nativa (floresta de araucárias) de aproximadamente 300 ha na área de inundação do reservatório. A floresta com araucárias (Fig. 15.1) constitui uma fitofisionomia outrora abundante nos planaltos do Sul do País, mas hoje reduzida a cerca de 3% de sua área original. Portanto, é indubitavelmente um componente ambiental relevante (seção 6.4) cuja perda constitui impacto ambiental significativo (seção 11.1). Ademais, o EIA tampouco mencionou a presença de uma espécie endêmica de bromélia que ocorre exclusivamente nas áreas de corredeiras do rio Pelotas. O caso foi à Justiça, mas o fato é que a decisão de licenciamento poderia ter sido diferente se o diagnóstico ambiental tivesse sido mais acurado e focado sobre questões relevantes.

Fig 15.1 Araucária (Araucaria angustifolia), espécie de conífera considerada ameaçada no Brasil, característica de formação florestal que ocupava vastas áreas do Sul do País

Por fim, embora se tenha insistido nas deficiências dos estudos ambientais, é óbvio que vários deles devem ter diversos méritos e que muitos podem mesmo ser excelentes. Apontar as deficiências certamente indica caminhos para saná-las, enquanto identificar os pontos fortes contribui para difundir as boas práticas.

15.3 FERRAMENTAS PARA ANÁLISE E AVALIAÇÃO DOS ESTUDOS AMBIENTAIS

Qualquer que seja a perspectiva de quem analisa um EIA (Quadro 14.1), há que se ter algum critério de leitura e análise. Para a equipe do órgão governamental que gerencia o processo de AIA, a análise técnica é a segunda tarefa mais importante, logo após a preparação dos termos de referência. A leitura crítica do EIA é a tarefa central, mas a análise costuma ser facilitada por outras atividades, como as imprescindíveis vistorias de campo, a eventual visita e empreendimentos similares, a consulta à bibliografia técnica e científica e a consulta a bases de informação e conhecimento da própria organização (pareceres anteriores, relatórios de monitoramento), que contribui para a coerência entre sucessivos pareceres. O trabalho de análise deve ser multidisciplinar, como deve também ser a preparação do EIA e, naturalmente, deve-se levar em conta os resultados da consulta pública.

A existência de um conjunto de critérios ou de diretrizes preestabelecidos para orientar o trabalho do analista pode ser um facilitador, pois ajuda a reduzir a subjetividade da análise e pode levar a resultados mais consistentes e reprodutíveis (quando grupos diferentes de analistas podem chegar às mesmas conclusões). O manual da Unep (1996, p. 509) salienta, apropriadamente, que “a análise consistente e previsível dos EIAs é importante para o tomador de decisão, para o proponente e para o público”, ao passo que “a qualidade dos EIAs pode ser melhorada quando o proponente conhece as expectativas da autoridade pública que gera o processo de AIA”.

A coerência dos critérios de análise dos órgãos governamentais é uma preocupação tanto dos empreendedores quanto de organizações da sociedade civil. Que o resultado da análise dependa da opinião (ou mesmo do “humor”) do analista não contribui nem para a eficácia nem para a eficiência de um sistema de avaliação de impacto ambiental, como apontado em 2009 por uma auditoria operacional do Tribunal de Contas da União acerca do licenciamento ambiental federal no Brasil (TCU, 2009). Desde então o órgão ambiental federal Ibama vem sistematizando procedimentos internos, a exemplo de outras agências ambientais que têm como diretriz oferecer ao público e aos empreendedores previsibilidade em suas conclusões, limitando a discricionariedade e variabilidade interindividual do trabalho de sua equipe de analistas (Sánchez e Morrison-Saunders, 2011), o que não significa, naturalmente, eliminar o julgamento profissional e a apreciação crítica do processo de análise técnica.

Uma das formas de facilitar o trabalho dos analistas é preparar previamente listas de verificação. Tais listas contêm um rol dos principais elementos que devem estar presentes em um estudo de impacto ambiental e podem também trazer recomendações para sua avaliação. Podem-se usar listas para verificação apenas formal (para avaliar a aderência ao conteúdo previsto na regulamentação) e listas para verificação do conteúdo dos estudos de impacto ambiental; naturalmente essas duas dimensões podem juntar-se em uma única lista. Listas de verificação são ferramentas relativamente simples para analisar estudos de impacto ambiental e têm a vantagem de poderem ser utilizadas por diferentes interessados.

A elaboração prévia de uma lista de verificação deverá refletir os requisitos da legislação e da regulamentação em vigor na jurisdição em que se dá o processo de AIA, e também as prioridades do organismo que realiza a análise dos estudos de impacto ambiental. Desse modo, não se pode pensar em uma lista universal, mas em listas adaptadas a cada jurisdição. Por exemplo, em Hong Kong, o Departamento de Proteção Ambiental utiliza uma lista com 79 perguntas, distribuídas em dez seções, quando analisa um EIA (HKEPD, 1997). O Quadro 15.3 mostra algumas questões dessa lista.

Um grupo da Universidade de Manchester, na Inglaterra, desenvolveu um procedimento de análise baseado na avaliação do conteúdo de cada um dos principais componentes normalmente encontrados em um EIA. Conhecido como Lee and Colley review package, do nome dos principais autores (versão revisada em Lee et al., 1999), esse procedimento foi usado ou adaptado em inúmeros estudos sobre a qualidade de EIAs (conforme seção 15.1). Para fins de análise, os estudos ambientais são divididos em quatro áreas: (i) descrição do projeto e do ambiente afetado; (ii) identificação e avaliação de impactos-chave; (iii) consideração de alternativas e medidas mitigadoras; e (iv) comunicação dos resultados. Cada área é subdividida em categorias, que por sua vez são subdivididas em subcategorias, estas com maior grau de detalhe. Por exemplo, a área “identificação e avaliação de impactos-chave” é composta pelas seguintes categorias: (a) identificação de impactos potenciais; (b) hierarquização dos impactos; (c) previsão da magnitude dos impactos; (d) avaliação da importância dos impactos. Já a área “comunicação dos resultados” inclui as seguintes categorias: (a) organização e apresentação do EIA; (b) acessibilidade do conteúdo para não especialistas; (c) impedimento de julgamentos tendenciosos; (d) apresentação das fontes de dados e métodos de análise utilizados; (e) presença de um resumo não técnico suficientemente abrangente.

Quadro 15.3 Extrato de uma lista de verificação do conteúdo de um EIA

2. DESCRIÇÃO DO PROJETO

2.1 Os propósitos e objetivos do projeto são explicados?

2.13 Foram indicados os meios pelos quais as quantidades de resíduos e poluentes foram estimados? Incertezas quanto às estimativas foram reconhecidas? Foram indicadas faixas de variação?

5. DESCRIÇÃO DOS IMPACTOS

5.1 Os efeitos diretos e indiretos/secundários da construção, operação e, quando relevante, da desativação do projeto foram considerados (incluindo efeitos positivos e negativos)?

5.5 A investigação de cada tipo de impacto é apropriada para sua importância para a decisão, evitando informação desnecessária e se concentrando nas questões-chave?

5.9 Os impactos são descritos em termos da natureza e magnitude da mudanças características do receptor afetado (localização, quantidade, valor, sensibilidade)?

6. MITIGAÇÃO

6.2 Foram descritas as razões para escolher determinado tipo de mitigação? Outras opções disponíveis foram apresentadas?

6.8 Algum efeito ambiental adverso das medidas de mitigação foi investigado e descrito?

9. DIFICULDADES NA COMPILAÇÃO DA INFORMAÇÃO?

9.2 Alguma dificuldade na coleta ou análise de dados necessários para prever impactos foi reconhecida ou explicada?

10. RESUMO EXECUTIVO

10.1 O resumo executivo contém pelo menos uma breve descrição do projeto e do ambiente, uma relação das principais medidas mitigadoras e uma descrição dos impactos ambientais remanescentes ou residuais?

Fonte: HKEPD (1997).

O método de Lee e Colley também emprega critérios para atribuição de um conceito ou nota a cada subcategoria, categoria e área, e de uma nota geral ao estudo de impacto ambiental, conforme Quadro 15.4. Pode-se adotar “C” como nota mínima para que o estudo seja julgado satisfatório e estipular, ademais, que cada capítulo também deva obter essa nota mínima. Caso contrário, o estudo deverá ser corrigido, no todo ou em parte.

Quadro 15.4 Conceitos para avaliação de estudos de impacto ambiental

NOTA

CRITÉRIO

A

Tarefa bem executada, nenhuma tarefa importante incompleta.

B

Geralmente satisfatório e completo, comporta somente omissões menores e poucos pontos inadequados.

C

Satisfatório ou aceitável, apesar de omissões ou pontos inadequados.

D

Contém partes satisfatórias, mas o conjunto é considerado insatisfatório devido a omissões importantes ou pontos inadequados.

E

Insatisfatório, omissões ou pontos inadequados significativos.

F

Muito insatisfatório, tarefas importantes desempenhadas de modo inadequado ou deixadas de lado.

N/A

Critério não aplicável.

Fonte: Unep (1996, p. 528).

Outra lista de verificação foi desenvolvida pela também inglesa Universidade Oxford-Brookes (Glasson et al., 1999). A lista é organizada em oito seções, cada uma delas com itens ou perguntas a serem avaliados segundo uma notação idêntica (A-F) à de Lee e Colley. As seções são: (i) descrição do projeto; (ii) descrição do ambiente; (iii) scoping, consulta e identificação de impactos; (iv) previsão e avaliação de impactos; (v) alternativas; (vi) mitigação e monitoramento; (vii) resumo não técnico; (viii) organização e apresentação da informação. O total de perguntas contidas nas oito seções é de 92.

Diretrizes para a análise de EIAs também foram publicadas pela Diretoria de Meio Ambiente da Comissão Europeia, acompanhadas de uma lista de verificação (European Commission, 1994, 2001b). O Quadro 15.5 traz uma relação de conceitos para avaliação (notas), sugeridos na edição de 1994; novamente, trata-se de uma escala usada para separar os estudos aceitáveis daqueles que devem ser recusados por não atingirem o nível exigível de qualidade.

Quadro 15.5 Conceitos para avaliação de estudos de impacto ambiental

CONCEITO

CRITÉRIO

Completo

Toda informação relevante para o processo decisório foi apresentada; nenhuma informação adicional é requerida.

Aceitável

A informação apresentada não está completa, todavia, as omissões não devem impedir o prossegui-mento do processo decisório.

Inadequado

A informação apresentada tem omissões significativas; é necessário apresentar informação adicional antes que o processo decisório possa prosseguir.

Fonte: European Commission (1994, p. 8).

A atribuição de uma nota para cada EIA, baseada no atendimento a critérios previamente definidos, é também feita pela Environmental Protection Agency, dos Estados Unidos (Quadro 15.6). Nesse caso, trata-se mais de uma análise qualitativa que resulta em uma classificação final que de uma nota que resulte de uma pontuação de cada componente do EIA.

Quadro 15.6 Conceitos para avaliação de estudos de impacto ambiental adotados pela USEPA

CONCEITO

CRITÉRIO

1 (adequado)

O EIA apresenta adequadamente os impactos ambientais da alternativa preferida e das alternativas razoáveis para o projeto ou ação, não sendo necessárias novas coletas de dados ou outras análises; porém, o analista pode sugerir o acréscimo de informação ou de esclarecimentos.

2 (informação insuficiente)

O EIA não contém informação suficiente para uma avaliação completa dos impactos ambientais que deveriam ser evitados, de forma a proteger completamente o ambiente, ou o analista identificou novas alternativas razoáveis que estão dentro do espectro de alternativas analisadas no EIA e que poderiam reduzir os impactos ambientais da proposta.

3 (inadequado)

O EIA não avalia adequadamente os impactos ambientais potencialmente significativos da proposta, ou o analista identificou novas alternativas razoáveis que estão fora do espectro de alternativas analisadas no EIA, que poderiam ser analisados a fim de reduzir os impactos ambientais potencialmente significativos. As necessidades de informação, dados, análises ou discussões são de tal magnitude que deveria haver uma nova consulta pública completa.

Fonte: USEPA (1984).

A EPA também avalia o projeto (ou ação) analisado no EIA. Pode haver um EIA muito bem feito para um projeto ruim ou que cause muitos impactos significativos. Inversamente, uma equipe incompetente pode preparar um EIA de péssima qualidade para um projeto viável e de baixo impacto ambiental. É verdade que se a avaliação ambiental de um projeto conclui que ele é inviável ambientalmente, o EIA nem seria apresentado ou o projeto deveria ser modificado até que a avaliação concluísse sua viabilidade. Na prática, isso pode não acontecer porque alguns empreendedores são demasiado obtusos para aceitar que a avaliação ambiental possa interferir com “seu” projeto ou por acreditar que, mesmo ruim, o projeto possa ser aprovado, talvez pelos benefícios econômicos que possa gerar ou pelos empregos que criar ou mantiver. Por isso se justifica a atitude da EPA de atribuir conceitos distintos ao EIA e ao projeto. O Quadro 15.7 mostra a classificação usada pela EPA.

A aplicação de listas de verificação, critérios de pontuação e outros procedimentos similares não somente orienta a tarefa de análise técnica, mas também pode estabelecer um método de comparação de EIAs para fins de pesquisa ou de avaliação do desempenho da AIA em uma determinada jurisdição, por exemplo procurando evidenciar alguma melhoria ao longo do tempo ou identificar setores da economia nos quais os EIAs poderiam ser de melhor qualidade.

Quadro 15.7 Conceitos para avaliação da viabilidade das ações causadoras de impacto ambiental adotados pela USEPA

CONCEITO

CRITÉRIO

LO (lack of objections) — sem objeções

A análise da EPA não identificou impactos ambientais potenciais que sem que requeiram mudanças substantivas da proposta apresentada. A análise apontou as oportunidades para aplicação de medidas mitigadoras que podem ser implementadas com pequenas mudanças na proposta apresentada.

EC (environmental concerns) — preocupações de ordem ambiental

A análise da EPA identificou impactos ambientais que devem ser evitados para proteger completamente o ambiente. Medidas corretivas podem requerer mudanças na alternativa preferida ou a aplicação de medidas mitigadoras que reduzam o impacto ambiental.

EO (environmental objections) — objeções de ordem ambiental

A análise da EPA identificou impactos ambientais, objeções de ordem ambiental, projeções de ordem ambiental significativas que precisam ser evitados para uma proteção adequada do ambiente. Medidas corretivas podem requerer mudanças na alternativa preferida ou a consideração de alguma outra alternativa de projeto (incluindo a alternativa de não realizar o projeto ou uma nova alternativa).

EU (environmentally unsatisfactory) — ambientalmente insatisfatória

A análise da EPA identificou impactos ambientais adversos de magnitude suficiente para serem considerados como insatisfatórios do ponto de vista da saúde pública, do bem-estar ou da qualidade ambiental.

Fonte: USEPA (1984).

Bojórquez-Tapia e García (1998), tendo analisado EIAs de 33 projetos rodoviários aprovados no México, também verificaram que as avaliações são subjetivas e tendenciosas. Ademais, sua análise mostrou problemas de scoping, uma vez que os estudos não foram dirigidos para os prováveis conflitos ambientais gerados pelos projetos. Esses autores empregaram dois enfoques para analisar os EIAs: (i) conformidade com as diretrizes governamentais para a preparação de EIAs; e (ii) qualidade dos dados, análises e conclusões. Para tornar operacional uma abordagem segundo este último enfoque, os autores definiram de antemão um conjunto de critérios de avaliação e uma escala de pontos para cada critério; em seguida, a soma de pontos resultava na nota de cada EIA, expressa como porcentagem da nota máxima possível. O Quadro 15.8 mostra uma seleção e adaptação de alguns critérios empregados por Bojórquez-Tapia e García, escolhidos por seu potencial de aplicação a outras jurisdições, ultrapassando, portanto, o contexto da regulamentação mexicana.

Outras formas de pontuação podem ser desenvolvidas para auxiliar na análise de estudos ambientais, mas é preciso ser muito cuidadoso no desenvolvimento e na aplicação de um enfoque de pontuação na análise de um estudo ambiental. Da mesma forma que na avaliação da importância dos impactos, o uso de uma escala de pontos pode dar uma aparência de objetividade ou de possibilidade de quantificação para uma atividade que é fundamentalmente qualitativa.

Em conclusão, a análise criteriosa e balanceada de um EIA requer discernimento, rigor e competência técnica. Como exprime Wood (1995, p. 162), há diferentes maneiras de buscar a objetividade na análise, mas “não há substituto para profissionais qualificados”.

Quadro 15.8 Critérios para avaliação da qualidade de estudos ambientais

CRITÉRIO

DESCRIÇÃO

PONTOS

Informação

Os dados necessários para identificação e análise dos impactos são formalmente apresentados e analisados (características técnicas do projeto e diagnóstico ambiental)

não = 0

sim, com omissões importantes = 1

sim, porém insuficiente para análise = 2

sim, porém de difícil compreensão = 3

sim, pequenas correções necessárias = 4

sim, apresentação exata e própria = 5

Documentação

As fontes de informação são claramente referidas

não = 0 sim = 1

Levantamentos

Os levantamentos de dados primários e secundários são descritos com metodologia resultados e interpretação,

não = 0

sim, porém de maneira vaga = 1

sim, com exatidão e rigor = 2

Metodologia

Técnicas usadas para análise dos impactos são descritas e usadas de acordo com a descrição apresentada

não = 0

sim, porém não usadas = 1

sim, porém usadas indiretamente = 2

sim, usadas diretamente = 3

Coerência

Dados apresentados em capítulos anteriores são usados para a análise dos impactos

não = 0

sim, parcialmente = 1

sim, integralmente = 2

Quantificação

Estimativas quantitativas de área afetada, atividades de projeto e indicadores de impactos quando aplicável

não = 0

sim, parcialmente = 1

sim, claramente = 2

Consistência

Definição prévia e aplicação de critérios de avaliação da importância dos impactos

não = 0

sim, porém aplicação ilógica = 1

sim, porém aplicação inconsistente = 2

sim, aplicação consistente = 3

Objetividade

Análises e conclusões são imparciais e os impactos relevantes são destacados

não = 0

sim, mas há abundância de comentários tendenciosos = 1

sim = 2

Especificidade

Medidas mitigadoras estão relacionadas aos impactos

não = 0 sim = 1

Auditabilidade

Medidas mitigadoras são formuladas de modo a permitir a verificação posterior de sua aplicação e eficiência

não = 0

sim, porém formulação imprecisa = 1

sim, porém somente algumas medidas = 2 sim, para todas as medidas = 3

Fonte: adaptado de Bojórquez-Tapia e García (1998); alguns termos e descritores desse quadro são muito próximos do original, porém alguns critérios foram renomeados e redefinidos.

15.4 OS COMENTÁRIOS DO PÚBLICO E AS CONCLUSÕES DA ANÁLISE TÉCNICA

Se há um procedimento de participação pública, então é preciso que haja maneiras de incluir os comentários e as opiniões do público na análise do EIA ou em algum documento de síntese, para que sejam também levados em conta no momento da tomada de decisão sobre a aprovação do projeto. Há diferentes maneiras de fazê-lo, dependendo de qual é a autoridade encarregada da análise técnica e de sua relação com o tomador de decisão.

No modelo de comissões independentes, adotado no procedimento federal do Canadá, os comissários recebem um parecer de análise feito por uma equipe técnica multidisciplinar e, em seguida, promovem uma consulta pública, ao final da qual formulam seu parecer conclusivo, incorporando o ponto de vista do empreendedor (expresso no EIA), o dos analistas (expresso no parecer técnico) e o do público (por meio da consulta pública). Na Holanda, os relatórios da Comissão de Avaliação de Impacto Ambiental enfocam o conteúdo dos EIAs e não a aceitabilidade da proposta (Wood, 1995), que é competência da autoridade setorial responsável. Os relatórios são publicados e deixam claras as recomendações feitas para os responsáveis pela decisão.

No modelo americano, a agência responsável (lead agency) prepara a minuta do EIA (draft EIS), submete o projeto a consulta pública, recolhe os comentários do público e das demais agências que possam ter competências na matéria (interagency review), e divulga o EIA corrigido e revisado (final EIS), documentando sua decisão em um registro (record of decision). Cabe, então, à agência principal considerar os comentários do público ao mesmo tempo que os pareceres técnicos.

No Brasil, nos Estados e municípios em que a decisão sobre licenciamento é tomada por um colegiado, este recebe um parecer técnico elaborado pelo serviço especializado do órgão ambiental. Tal parecer, fundamentalmente, analisa e avalia o EIA, mas deve levar em conta, nessa análise, os comentários e as recomendações de outros órgãos governamentais, assim como as manifestações do público, expressos em audiência ou enviados diretamente por escrito3. Cabe, portanto, aos analistas ambientais a tarefa de integração das opiniões técnicas e das opiniões dos cidadãos.

Portanto, o parecer técnico sobre o EIA e sobre o projeto é um dos documentos mais relevantes do processo de AIA (conforme Quadro 4.2). É essencialmente este o documento que irá subsidiar e fundamentar a decisão, mesmo quando não são os analistas que a tomam diretamente. Em princípio, os Rimas deveriam fornecer uma descrição concisa e ao mesmo tempo abrangente do projeto e de seus impactos, mas sabe-se que eles costumam ser pouco sintéticos e não raro são também pouco objetivos. Os EIAs, por seu lado, ademais de geralmente serem longos — o que os torna de difícil leitura para os tomadores de decisão —, podem ser rapidamente suplantados por relatórios de informações complementares que nem sempre são do conhecimento público. Por esse motivo, Wood (1995, p. 180) pondera que, quando há requisição de informações complementares, “a forma desse material adicional pode ser díspar e consistir de vários documentos diferentes”, razão pela qual aponta que “uma vantagem dos EIAs revisados (final EIS) é que toda a informação está agregada em um único documento”.

Assim, também o parecer técnico deveria mostrar as mesmas qualidades de um bom EIA, deixando claras, para os encarregados da tomada de decisões, quais as implicações em jogo. Unep (1996) aponta que a análise técnica deveria observar dois requisitos:

  identificar as deficiências dos EIAs;

  identificar os problemas cruciais e determinar quais são aqueles que podem influenciar diretamente a decisão, “claramente separando os defeitos cruciais das deficiências menos importantes”; caso nenhuma omissão séria seja verificada, essa conclusão deve ser exposta, claramente.

Portanto, legibilidade, clareza e concisão são qualidades requeridas de um parecer técnico. Obviamente não se pode estabelecer um tamanho máximo ou mínimo para esse documento, pois o tamanho ideal dependerá da complexidade do projeto e da importância dos impactos mais relevantes. Não é incomum encontrar pareceres que são verdadeiros resumos do EIA, com longas transcrições e mesmo com a reprodução de sua estrutura, mas sem mapas, figuras e fotografias que possam facilitar a compreensão do projeto, o que obriga o leitor interessado, necessariamente, a consultar o EIA ou o Rima, se quiser realmente entender o projeto. Outro inconveniente das longas transcrições é que afirmações feitas pelo empreendedor ou seu consultor passam a ser assinadas pelos analistas do órgão governamental, nem sempre com as devidas verificações ou ressalvas. Muita descrição e pouca análise são o contrário do que se espera de um parecer conclusivo.

Bom senso deveria ser exercido também nessa tarefa (Ross et al., 2006; Sánchez, 2006). Contudo, não se deve desconsiderar a possibilidade de um controle judicial (conforme seção 17.5), ou seja, de questionamentos na Justiça sobre a decisão tomada, sendo importante, portanto, que as recomendações do parecer técnico estejam adequadamente fundamentadas e justificadas — mas isso não quer dizer que haja necessidade de fazer um longo resumo do EIA.


1Embora esta tarefa seja, às vezes, denominada revisão, por semelhança ao termo inglês review, a tradução não é adequada, uma vez que se trata de uma análise crítica e não de uma revisão à procura de erros ou com finalidade de melhorar o texto.

2Os primeiros estudos de impacto eram relatados somente nos Rimas, inexistindo um volume denominado EIA, consoante uma interpretação textual da Resolução Conama 1/86.

3Machado (2003, p. 238) observa: “Os comentários são escritos. Não têm forma prevista, podendo ser apresentados manuscritos ou datilografados; pode-se exigir recibo de sua entrega ao órgão público ambiental”.